Entrevista com Toshifumi Murata, Presidente da Câmara de Comércio e Indústria Japonesa do Brasil
Entrevistador: Poderia nos descrever seu trabalho?
-Uma das mais importantes funções da Câmara de Comércio e Indústria Japonesa do Brasil é apoiar as empresas associadas, aproximadamente 360 atualmente, apontando as possibilidades a seguir através das atividades de diversas Comissões e Subcomissões. Como representante das empresas associadas, japonesas e nikkeis, participo ativamente em diversos eventos organizados pela Embaixada do Japão no Brasil, assim como pelo Consulado Geral em São Paulo, e em várias organizações nikkeis.
Entrevistador: Sr. Murata, o senhor tem algum hobby?
-Meu hobby é correr e jogar golfe. Na corrida, faço parte do grupo de expatriados japoneses. Em geral corro sozinho, mas agora a corrida a pé está se popularizando no Brasil, e uma vez por mês são organizados eventos esportivos, quando participo de corridas de 10km e de meia maratona em companhia de meus colegas. No momento estou me preparando para correr uma maratona.
Entrevistador: Quais são as suas impressões com relação à diferença de estilo de vida no Brasil, residindo por dezenove anos no País?
-Desde a infância o japonês é educado a fazer ou não fazer as coisas de forma [mais ou menos] rígida, e sinto como se estivesse sob pressão. Portanto, as normas são observadas estritamente, e isso, num sentido, possibilita uma certa unidade. Evidentemente, se vivesse no Japão, creio que seria necessário seguir esse padrão. Entretanto, penso que a Essência não muda, seja na cultura brasileira, japonesa ou em qualquer outro país. Por exemplo, as reações espontâneas das pessoas não mudam significativamente: descansar, quando se está cansado ou dormir mais um pouco, se desejar… Os japoneses são doutrinados a fazerem as coisas de uma certa forma e tem que ser daquele jeito. Entretanto, do ponto de vista de um adulto, será que isso está realmente correto? Simplesmente é ensinado assim por fazer parte do sistema de educação do Japão, mas da perspectiva de uma cultura estrangeira, coloco um ponto de interrogação se esse é realmente o caminho certo.
O brasileiro cresce convivendo com a pluralidade racial, religiosa e familiar. Justamente por causa desta grande variedade cultural no País, as pessoas exprimem seus sentimentos espontânea e livremente, sem pressão ou fingimento. Se numa dada situação alguém age de forma diferente, o brasileiro é capaz de aceitar incondicionalmente, pois ele vive conforme seus próprios sentimentos. Contrariamente, o japonês talvez não tenha a mesma abertura para a aceitação da situação. Acho que essa seja uma das diferenças no estilo de vida entre o brasileiro e o japonês.
<O Fascínio do Brasileiro>
Com estas considerações, o que me fascina no brasileiro é a sua capacidade de “tolerar”. Como cada ser tem uma maneira diferente de pensar, é natural também ter um estilo de vida próprio, não é mesmo? No fundo, é admirável o jeito de viver do brasileiro, seguindo o seu coração. Se a gente não viver por longo tempo no Brasil, talvez não consiga perceber essa sutilidade, mas no dia a dia sinto que me tornei também tolerante com relação à essa diferença.
<O brasileiro está sempre animado>
Acho que os japoneses estão muito cansados. Os japoneses estão sempre dormindo, seja dentro dos aviões, no trem-bala (Shinkansen) ou nos trens; sinto que são muitos os que estão com os olhos fechados. Os brasileiros, pelo contrário, conversam bastante. Eles têm energia, são ativos e muito animados. Acho que é um grande contraste. Assim, no trabalho, sinto-me bem refrescando a cabeça com o esporte; sou do tipo positivo para enfrentar o trabalho. Se estivesse no Japão, seria no estilo japonês, mas aqui faço o possível para seguir o estilo local.
<Tecnologia da Informação – O Japão é um país desenvolvido?>
A imagem do Japão como um país desenvolvido em tecnologia informática é uma ideia equivocada, difundida entre os brasileiros. A realidade é diferente, e creio que na verdade estamos muito aquém. Por exemplo, o Brasil pode apurar os resultados das eleições imediatamente, por ser o voto eletrônico. Claro que votar no papel, como no Japão, tem seu valor, embora não utilize a TI. O Japão finalmente adotou o sistema numérico de identificação “My Number”, enquanto que aqui no Brasil o sistema de CPF já está digitalizado. Quanto à identificação biométrica do usuário e ao pagamento pelo código de barra, o Japão ainda está bastante atrasado em relação a estes setores.
O brasileiro que viaja ao Japão pela primeira vez volta impressionado, dizendo que o Japão é um país organizado e, por outro lado, a situação atual do Brasil ainda deixa a imagem de ser um país caótico e confuso: penso que são estereótipos que se sucedem de ambas as partes.
Entrevistador: Quais são suas impressões sobre a cultura japonesa sob um novo olhar?
-Aqui percebe-se que ainda é necessário expressar-se através de palavras, enquanto que, no Japão, sinto que há um mundo de entendimento sem a necessidade de verbalização.
No Brasil é comum abraçar, mesmo entre os homens. Há vários graus de abraços e mesmo uma diferença sutil no calor desse abraço: um abraço forte entre amigos próximos, ou um pouco mais formal num primeiro contato. No Japão não existe o hábito de abraçar, quando muito apenas um aperto de mãos. Entretanto, se analisar a aproximação entre as pessoas, pela experiência, não há uma conexão de coração a coração, mas de sintonia mutua, de entendimento tácito e, mesmo que não compreendam entre si, sinto que por trás disso há certamente profundidade. Creio que o ponto de excelência do japonês é o fato de ser capaz de sentir o outro mesmo sem ter esse contato, de perceber através de um espirito calmo e sentir o que o outro está pensando.
Entrevistador: Qual é sua relação pessoal com a Cerimônia do Chá e seus encantos?
-Honestamente falando, nunca me cruzei com o chadô, porque sou mais esportista. Na escola secundária havia um clube de chadô, e lembro-me de ter participado uma vez, servindo-me do doce e do chá no Festival Cultural. Tenho assistido a cenas de chanoyu nas longas séries de drama histórico na TV e, com o passar do tempo, ainda me lembro de meu interesse com relação ao relacionamento entre o anfitrião e o convidado. Acho que o encanto do chanoyu não está na forma, mas em sentir e apreciar o espaço que compartilhamos.
Entrevistador: Qual é a sua filosofia de vida?
-No beisebol de amadores, a opinião geral é que o jogador mais incompetente ou inexperiente é o campista direito número 9. Ao constituir uma equipe, começa-se pela orientação em primeiro lugar, ensinando com paciência e atenção o campista direito número 9 a esforçar-se. Ao mudar a sua motivação, os demais jogadores posicionados não conseguirão ficar de pernas cruzadas [como um Buda] e, naturalmente, a equipe torna-se forte, cujo resultado é o crescimento em geral. Tem momento em que eu mesmo sou o campista direito número 9 e, em outro momento, sou o chefe da equipe. Motivo os jovens e os inexperientes, e em qualquer aspecto meu lema é ter a atitude mental de valorizar o campista direito número 9.
Muito obrigado por nos ter concedido esta entrevista.
Entrevista em maio de 2016
Agosto de 2016