- A Paz Através de Uma Tigela de Chá -

Shôgo Chaji de 06 de setembro

O Chaji do meio-dia de 06 de setembro, do anfitrião Valderson Sôchi de Souza, foi realizado na sala de chá Hakuei-an. Dessa vez, foi no estilo ryûrei, e o convidado principal foi Antonio Fabiano da Silva Santos, de Belo Horizonte. O Sr. Valderson é professor de Ikebana, e no Chadô tem seu chamei e uma posição de instrutor.

No dia, ele colocou flores de azaleia laranja em um vaso pendurado, de cobre, em forma de lua cheia. Setembro é a época de apreciar a lua (tsukimi), e a azaleia é símbolo de São Paulo e significa “sorte”. Na azaleia está inserida a “esperança” de não sucumbirmos em face da pandemia da Covid-19. À meia-luz, as flores emergiram fantasticamente.

 

IMPRESSÕES DO CONVIDADO PRINCIPAL – SHÔKYAKU – Antonio Fabiano da Silva Santos

Sob aquela luz difusa das tardes que vão mudando de cor – à medida que o inverno caminha para o fim – recebi o convite para o Chaji. Nosso anfitrião, o Ilmo. Sr. Valderson Sôchi, versado no Caminho do Chá e no Caminho das Flores, escreveu com seu coração que gostaria de nos servir chá e que, com simplicidade, o faria em um Chaji de esperança. Esse encontro foi verdadeira celebração de esperança, pelo tempo difícil que estamos acabando de atravessar. *

Quando parti de Belo Horizonte para São Paulo, sabia que seriam muitas horas de viagem. Mas era imensa a minha alegria de voltar a Hakuei-an e poder rever, depois de tanto tempo, amigos e mestres queridos. No caminho, enviei ao anfitrião minha resposta de aceitação do convite e confirmação da presença em dia e hora por ele assinalados:

Eis que já são flores

os ipês da rodovia —

Vou a teu Chaji!

De fato, a natureza do Brasil antecipara-se ao equinócio e já proclamava com vigor a chegada da primavera em todos os cantos.

O Chaji aconteceu como um rio fluindo sobre um leito arenoso. Havia muita comunhão entre os corações. Em muitos momentos as palavras tornaram-se absolutamente dispensáveis. Fez-me lembrar o que está escrito em um dos livros sagrados, sobre a comunhão dos veneráveis primeiros cristãos: “um só coração e uma só alma”. **

Cada utensílio, carregado de sentimentos e histórias pessoais, trouxe para dentro da sala de chá e para nossas almas o verdadeiro significado da consideração máxima que deve haver entre as pessoas do Chadô. A comida do mar e da montanha, expressão da bondade divina e do trabalho humano, os belos doces, a deliciosa tigela de chá, as flores arranjadas com destreza pelo anfitrião, o perfume do incenso, tudo manifestava, de modo inefável, harmonia, respeito, pureza e tranquilidade.

Eu senti muita alegria em participar dessa Cerimônia do Chá com a Sra. Norma Pires (jikyaku) e a Sra. Mizumoto Sôho (tsume). Senti muita gratidão pelo cuidado do Ilmo. Sr. Valderson Sôchi (teishu) e da Sra. Carmen Sôka (hantô), e pela assistência carinhosa e eficiente dos queridos professores Sôkei Hayashi e Sôen Hayashi. Eu agradeço – com reverência – a condução do mestre Sôichi Hayashi. Sua presença tranquilizadora e discreta, a garantir o bom êxito do Chaji, é verdadeiramente admirável.

* Refere-se às muitas perdas e aos sofrimentos ocasionados pela pandemia. Refere-se também à realidade do período em que, pelo mesmo motivo, as escolas de Chadô em todo o mundo foram fechadas e os chajins não podiam se encontrar.

** Essa citação é do século I e está na Bíblia Sagrada, no livro dos Atos dos Apóstolos 4,32.

IMPRESSÕES DA SEGUNDA CONVIDADA – JIKYAKU – Norma Pires

Foi a primeira vez que fui convidada para um Chaji, não fazia ideia que vivenciaria uma das mais belas e marcante experiência.

Fomos recebidos pelo Sôichi Sensei que nos acalmou explicando com paciência o ato de purificação na pia de pedra (tsukubai), e assim continuou orientando durante todo encontro.

Fui me emocionando desde o início… com o soar do gongo, a chabana feita no vaso lua, com azaleia, e a caligrafia “Shôfuku”, que despertaram em mim lembranças de momentos felizes vivido no passado.

Em cada utensílios podemos perceber a sinceridade e o verdadeiro sentimento do nosso Anfitrião (teishu) Valderson, a assistente (hantô) ser a Profa. Carmen Luci foi uma grande e agradável surpresa, a saborosa comida, o delicioso Chá. Enfim tudo estava perfeito.

Quero agradecer Sôkei, Sôen, Sôichi Sensei e a todos que contribuíram com esse maravilhoso e prazeroso Chaji, foi um verdadeiro Ichigo-ichie guardarei esse dia para sempre no coração.

Muito Obrigada!

IMPRESSÕES DA ÚLTIMA CONVIDADA – TSUME – Mizumoto Sôho

Foi uma experiência única. Primeira vez que participei do Chaji, fui a última convidada (tsume).

Fiquei admirada com a dedicação do teishu e hantô, e de todos os envolvidos no Chaji. A escolha dos utensílios, da refeição kaisekiotemaekakejikuohana e a escolha dos convidados.

Foi uma emoção muito grande ao ver cada detalhe de cada etapa, e sentir o quanto foi trabalhoso e dedicado para que tudo acontecesse com muita harmonia no desenrolar de todo o processo do Chaji.

No Chaji senti profundamente a importância da prática do ichigo-ichieomotenashiikigai na vida cotidiana.

Parabéns aos professores, teishuhantô e colaboradores pelo sucesso!

IMPRESSÕES DA ASSISTENTE – HANTÔ – Carmen Luci Conte Vieira

Em um dia com a suave brisa da chegada da Primavera, aconteceu o nosso Chakai.

Foi emocionante.

Não nos víamos há algum tempo. Principalmente nosso colega chajin Antonio.

Foi muito emocionante abrir o fusuma e ver o sorriso de todos.

Tudo correu harmoniosamente e aprendemos bastante no preparo deste encontro.

Agradeço profundamente a oportunidade de ser convidada como hantô.

Aprendemos também com o servir incansável nos bastidores da Sôen Sensei.

Foi um dia inesquecível, que guardaremos para sempre no nosso coração.

Ichigo-ichie

IMPRESSÕES DO ANFITRIÃO – TEISHU – Valderson Sôchi de Souza

SOBRE O CHAJI DA ESPERANÇA

Desde o início da trilha no Caminho do Chá somos avisados de que iremos aprender em partes, a saber, desde como andar, sentar, tocar nos objetos, colocar água na chaleira, etc. até chegar às complexas cerimônias que, qual capsula do tempo, nos remetem a comportamentos e estéticas de muito tempo atrás. Tudo é seriado, compartimentado e leva muito tempo para ser apreendido. O método é lento e silencioso. Então aprendemos que a cerimônia do chá é a união de todas essas partes e que tem a duração de quatro horas.

Como estamos no Brasil, é muito rara a oportunidade de realizar a cerimônia do chá em sua totalidade. Estudo e pratico o Chadô há décadas e somente agora tive a oportunidade de participar de uma cerimônia completa na categoria de teishu / anfitrião.

Fiquei muito honrado quando recebi a proposta do sensei para realizar o evento. Com a alegria veio também a preocupação. Terei eu os conhecimentos para tanto ou tenho o dôgu (objetos da cerimônia do chá) suficiente para uma cerimônia do chá completa? Entre muitos outros questionamentos e indecisões.

Porém o apoio e a orientação aconteceram; o Sôichi sensei, a Sôen sensei e a Bertha sensei foram seguros e objetivos em suas observações. Os objetos foram escolhidos e definido o tema do encontro: a esperança, que nasce como um raio de sol nos corações para nos fortalecer e orientar neste tempo de pandemia.

Foram intensos os preparativos pois usamos uma mesa especial – tenchaban, e isso altera muitos procedimentos habituais na realização das cerimonias do carvão e do chá. Vencemos os desafios e nos esforçamos, eu e a hantôsan Carmen Sôka sensei, para realizarmos algo único e memorável. E assim foi.

Na segunda feira agradável do começo de setembro, bem cedo, demos início ao chaji com a preparação do ambiente, uma purificação para limpar a sala de chá de tudo que não fosse harmonia e respeito. E foi com a sensação de tranquila alegria que iniciamos a reunião.

O convidado principal – Shôkyaku, foi o chajin Antonio Fabiano, que ao aceitar o convite e vir de longe para o evento, reafirmou nossos laços de amizade e me deixou honrado. E também a segunda convidada – Jikyaku, foi a sra. Norma Pires, e a última convidada – Tsume, foi a sra. Noriko Sôhô Mizumoto, amiga de caminhada no Chadô. Eles foram perfeitos, fraternos e acolhedores, criando um sentimento de partilha de momentos únicos e especiais.

kaiseki – refeição preparou os sentidos para uma maior percepção das cerimônias. E tudo transcorreu em paz, com a simples beleza das coisas verdadeiras. Na primeira parte do encontro o tokonoma da sala principal exibia a caligrafia “Shôfuku” (招福), que faz o convite à felicidade para aqui participar, e na segunda parte as flores de um galho de azálea surgiam de um vaso que representa a lua cheia, e faz recordação que setembro é o período de observação da lua – tsukimi.

Buscamos a beleza do aperfeiçoamento humano, a prática de nos tornarmos pessoas melhores, e trilhar o caminho do chá nos ajuda nesse propósito. Juntar todas as peças do quebra-cabeças e realizar a cerimônia do chá em sua totalidade nos deu uma experiência e uma visão únicas. O Caminho ganhou novos significados e a vida tornou-se maior.

Este chaji ficará em minha memória guardado como uma joia preciosa, única em sua beleza e repleta de emoções. Obrigado ao Centro Chado Urasenke do Brasil e família Hayashi pelos ensinamentos, amizade e confiança!

 

Dezembro de 2021